O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), vem intensificando o embate com organizações culturais com ideologias progressistas, ligadas à esquerda, que atuam na capital. A postura adotada por ele desde o início deste segundo mandato à frente da gestão municipal vai ao encontro do comportamento adotado durante a campanha eleitoral de 2024, de maior alinhamento com as pautas da direita e com o legado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Se de um lado o posicionamento de Ricardo Nunes agrada o eleitorado conservador, de outro vem desagradando parte da classe artística. Após o cancelamento, em agosto, da Festa Literária Pirata das Editoras Independentes (Flipei), por se tratar de um evento de cunho político-ideológico, a prefeitura cancelou o contrato da Fundação Theatro Municipal de São Paulo com a Organização Social (OS) Sustenidos.
A gestão de Ricardo Nunes já vinha insatisfeita com a programação do Theatro devido a pautas ligadas à ideologia identitária de esquerda. Havia, também, problemas apontados pelo Tribunal de Contas do Município, mas a gota d’água foi a recusa da Sustenidos em demitir o funcionário que postou conteúdo considerado inadequado, sobre a morte de Charlie Kirk.
O caso foi denunciado, principalmente, pelo cineasta Josias Teófilo, cocriador do movimento Artistas Livres, e por vereadores da Câmara Municipal de São Paulo, como Sonaira Fernandes (PL) e Adrilles Jorge (União). “Compreendemos que o caso gerou uma discussão político-partidária, mas ela deve ser feita por entes políticos nas esferas adequadas, e não por nós”, afirmou a Sustenidos em nota à imprensa após a rescisão do contrato.
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Prefeitura desapropria Teatro de Contêiner de terreno na cracolândia
Outra frente de embate envolve a Companhia Mungunzá de Teatro, alvo de uma ação de despejo movida pela gestão Ricardo Nunes. A prefeitura pretende retomar o terreno público onde funciona o equipamento cultural para construir unidades de habitação de interesse social, no centro de São Paulo, na antiga cracolândia.
Em maio, o grupo recebeu uma notificação extrajudicial que dava 15 dias para desocupar o espaço. No dia 19 de agosto, a Guarda Civil Metropolitana (GCM) realizou uma reintegração de posse, retirando os artistas à força.
Dois dias depois, em 21 de agosto, a Justiça concedeu uma liminar que garantiu a permanência da companhia por 180 dias. No entanto, em 25 de setembro, o Tribunal de Justiça de São Paulo atendeu a um recurso da prefeitura e determinou que o imóvel seja desocupado no prazo de até 90 dias.
“A Prefeitura de São Paulo informa que ofereceu ao Teatro de Contêiner Mungunzá quatro áreas na região central para a continuidade das atividades do grupo. A direção da companhia, no entanto, abandonou a mesa de negociação e ingressou com medida judicial. Na quinta-feira (25/9), a Justiça atendeu a um pedido da Prefeitura e determinou que o teatro deixe o terreno em 90 dias. Além disso, a gestão já aportou R$ 2,5 milhões em apoio às atividades do grupo de teatro”, disse a prefeitura de São Paulo em nota à Gazeta do Povo.
No caso do Theatro Municipal, a prefeitura afirmou que “solicitou o cancelamento do contrato com a atual gestora, processo que está em andamento. A organização tem prazo legal de 15 dias para se manifestar, contado a partir de 19/9. Paralelamente, segue em consulta pública, até esta terça-feira (30/9), a proposta de edital de chamamento para escolha de nova Organização Social. A abertura do chamamento foi determinada pelo Tribunal de Contas do Município”, disse a nota.
Artistas reagem com abaixo-assinado e vídeo com Gregório Duvivier
Em reação às medidas, os grupos se organizam para tentar reverter as decisões da prefeitura de São Paulo. Um abaixo-assinado criado em favor da permanência da Sustenidos na gestão do Theatro Municipal foi lançado na semana passada e contava com 13,1 mil assinaturas até esta segunda-feira (29).
Além disso, na última sexta-feira (26), artistas como Camila Pitanga, Denise Fraga, Gregório Duvivier e Bete Coelho gravaram um vídeo enaltecendo a forma como o Theatro Municipal vem sendo gerido, com diversidade e inclusão, e pedindo que a Sustenidos se mantenha como gestora responsável pela Fundação.
Por outro lado, o Teatro de Contêiner Mungunzá aceitou o novo local proposto, próximo ao atual, mas está negociando com a prefeitura um terreno com 1.400 m², maior que os 1 mil m² propostos. O objetivo é manter a mesma dimensão atual, onde funcionam, além do teatro de contêiner, ateliê de costura, sala pedagógica e estúdio audiovisual.
“Fizemos a contraproposta no início de setembro, mas ainda não tivemos retorno”, diz Marcos Felipe, artista do Teatro de Contêiner. Ele critica principalmente a gestão da Secretaria Municipal de Cultura, que tem Totó Parente (MDB) à frente da pasta desde janeiro.
“O prefeito está sendo mal assessorado, o Totó Parente não tem condições mínimas de ocupar o cargo. A gestão tem, sim, um viés mais centro-direita, mas é completamente possível alinhar as demandas artísticas com as demandas da atual gestão”, diz Marcos Felipe.
Independente dos resultados da negociação, uma coisa é certa: ainda que por motivos diversos, os grupos culturais com forte ligação às ideologias woke estão enfrentando obstáculos maiores para fazerem seus shows na cidade de São Paulo.
Fonte: Gazeta do Povo