O mapa da cevada malteira no Brasil está em plena transformação. Tradicionalmente associada ao Rio Grande do Sul, a cultura perdeu força no estado que já cultivou mais de 100 mil hectares no fim da década de 1990. Em 2024, a área não chegou a 37 mil hectares, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
A retração abre espaço para dois movimentos: o avanço do Paraná, que sustenta a indústria cervejeira nacional, e a corrida do cerrado, onde Goiás tenta se firmar como novas fronteiras produtivas. No ano passado, a produção nacional foi de 427 mil toneladas em 117 mil hectares, com produtividade média de 3.6 kg/ha, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Esse volume está longe de atender a indústria. “Para atender à necessidade de grãos de cevada por parte das maltarias instaladas no Brasil são necessárias, anualmente, cerca de 1,1 milhão de toneladas de grãos, ou seja, mais que o dobro do volume que tem sido produzido nos últimos anos”, explica Aloisio Vilarinho, pesquisador da Embrapa Trigo. Para suprir essa demanda, de acordo com o pesquisador, seriam necessários pelo menos 300 mil hectares de cultivo, mais que o dobro da área atual.
Paraná sustenta indústria cervejeira
O estado do Paraná colheu 284 mil toneladas em 77 mil hectares em 2024, respondendo por quase 65% da produção nacional. As informação são do Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento.
De acordo com o órgão estadual, o desempenho foi determinante para o abastecimento nacional. O avanço também se deve à retração gaúcha e à queda drástica em Santa Catarina, que reduziu em 79% sua área de cultivo.
“No ano passado, somente 30% da produção de cevada gaúcha foi para a produção de malte e 70% da safra do Paraná atendeu a indústria cervejeira. Nesta safra, acredito que o aproveitamento seja superior a 90%, com grãos de excelente qualidade para malteação”, afirma Vilarinho.
Cerrado é a aposta para o futuro da cerveja brasileira
Enquanto o Paraná salva a safra atual, o Cerrado aparece como aposta para o futuro. É o que apontam os pesquisadores da Embrapa Trigo e da Embrapa Cerrados, que testam cultivares adaptados ao calor e à irregularidade hídrica da região. Goiás e Minas Gerais estão no centro desse esforço, que conta ainda com cooperativas e universidades.
A ideia é consolidar a cevada como alternativa viável de rotação de culturas em áreas irrigadas. Segundo os pesquisadores, a proximidade das maltarias instaladas no Centro-Oeste facilita a logística. Isso também pode reduzir a dependência de importações, hoje necessárias para suprir a lacuna de oferta.
O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de cerveja.
O desafio é alto. A indústria exige padrões rigorosos: teor de proteína entre 9,5% e 12%, taxa mínima de germinação de 95% e grãos grandes, livres de micotoxinas. “Em anos com frustrações climáticas, como seca na implantação das lavouras ou excesso de chuva na pré-colheita, os grãos podem não atingir qualidade para malteação. Por isso, são destinados à alimentação animal com, no máximo, 50% do valor da cevada com padrão cervejeiro”, reforça Vilarinho.
O esforço nacional para fortalecer a cevada não é casual. O Brasil é o terceiro maior produtor mundial de cerveja, atrás de China e Estados Unidos. Foram 13,280 mil toneladas em 2023, uma média de 63 litros por habitante, segundo o site Atlasbig, uma organização de estatísticas mundiais.
Fonte: Gazeta do Povo