O grupo Hamas e Israel concordaram com o primeiro passo de um plano de cessar-fogo, proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em um grande avanço que muitos estão comemorando com otimismo cauteloso.
A primeira fase do acordo incluirá a libertação de todos os reféns, a retirada das tropas israelenses de Gaza para uma linha previamente acordada e a soltura de alguns prisioneiros e detidos palestinos. Trump também anunciou a criação de um “conselho de paz” para manter um fim duradouro ao conflito na região.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, reunirá seu governo nesta quinta-feira (9) para ratificar o acordo. Por lei, após o gabinete votar a favor da resolução, há um curto prazo para a apresentação de petições contestando as libertações; após esse obstáculo ser superado, o governo pode prosseguir com a libertação dos reféns.
Casa Branca divulga proposta de Trump
No mês passado, após Israel fazer várias revisões no texto do plano, alguns líderes árabes hesitaram e pediram que a proposta não fosse tornada pública, disseram pessoas familiarizadas com a situação. A Casa Branca divulgou o plano mesmo assim, e os líderes árabes aderiram.
E quando o grupo Hamas ofereceu uma resposta que não chegou a endossar totalmente cada um dos 20 pontos do plano, Netanyahu hesitou em considerar a resposta uma vitória.
O presidente americano encarou a situação de forma diferente e disse ao premiê israelense que estava sendo negativo, segundo uma pessoa familiarizada com a ligação.
Poucas horas após receber a notícia, ele considerou o grupo “pronto para uma PAZ duradoura” e ordenou que Israel interrompesse seus bombardeios.
Em todos os casos, o republicano ignorou as preocupações que acreditava que poderiam prejudicar o progresso rumo ao fim de uma guerra com a qual ele estava cansado de lidar.
Ao avançar rapidamente — mesmo em meio às dúvidas de seus aliados — Trump esperava gerar o tipo de impulso que lhe escapou desde que assumiu o cargo, há oito meses.
Resta saber se sua abordagem gerará uma paz duradoura.
Seu anúncio na quarta-feira (8) não mencionou o desarmamento do Hamas, condição imposta por Netanyahu. Tampouco falou qual o papel que o grupo palestino poderá desempenhar em Gaza daqui para frente.
Em vez disso, ele sugeriu que essas questões serão deixadas para outra fase das negociações.
O anúncio de quarta-feira, diz ele, representa os “primeiros passos em direção a uma Paz Forte, Duradoura e Eterna”.
O plano de Trump surge de crise diplomática
O plano de 20 pontos que serviu de base para a libertação iminente de reféns nasceu em uma crise diplomática.
Os ataques de Israel contra líderes do Hamas dentro do Catar em 9 de setembro foram originalmente vistos na Casa Branca como tão provocativos que poderiam reverter qualquer progresso rumo ao fim da guerra.
Donald Trump passou grande parte da presidência cultivando a simpatia de autoridades catarianas, que há muito tempo desempenhavam um papel de mediação com o Hamas nos esforços para encerrar o conflito em Gaza.
Em maio, ele se tornou o primeiro presidente em exercício a visitar a pequena nação do Golfo. Ele aceitou um presente incomum do reino: um Boeing 747 de luxo que agora está sendo adaptado para servir como Força Aérea Um.
Seus laços estreitos com os líderes do Catar tornaram os ataques de Israel em Doha ainda mais irritantes para Trump. Ele ficou furioso porque Netanyahu fez pouco esforço para alertá-lo sobre os planos de Israel.
Quando o enviado especial dos EUA, Steve Witkoff, falou ao telefone com os catarianos para avisá-los sobre o ataque iminente, este já havia começado, disseram autoridades do Catar mais tarde.
Nos bastidores, o ataque agravou a irritação constante do presidente americano com o premiê israelense.
Em um telefonema posterior, Trump criticou Netanyahu, chamando os ataques de “inaceitáveis”.
O presidente declarou mais tarde a alguns assessores que achava que o primeiro-ministro estava tentando acabar om ele, utilizando um palavrão, ao atrapalhar os esforços para fechar um acordo, segundo uma pessoa familiarizada com seu comentário.
A preocupação de que o presidente estivesse sendo manipulado cresceu entre alguns aliados do republicano.
No entanto, em meio à fúria, outro fenômeno estava em andamento.
As ofensivas israelenses — que mataram um oficial de segurança catariano, mas não eliminaram nenhum líder do Hamas — estimularam as nações árabes contra Israel.
E a ira de Trump contra Netanyahu proporcionou uma nova alavanca em um relacionamento já tenso.
A mudança na atmosfera diplomática foi uma janela, na visão deo líder americano e seus assessores.
Em vez de permitir que os ataques interrompessem as negociações de cessar-fogo, em grande parte paralisadas, Trump e Witkoff — com a adição do genro do presidente, Jared Kushner, retomando o papel de negociador no Oriente Médio que ocupou no primeiro mandato de Trump — estavam determinados a transformar a crise em oportunidade.

Combinando componentes de vários planos oferecidos por nações árabes, líderes europeus e uma proposta escrita pelo ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair, que vinha discutindo um plano pós-guerra para Gaza com a Casa Branca há meses, Witkoff e Kushner elaboraram um plano de 21 pontos ao longo de algumas semanas para apresentar aos líderes árabes em uma cúpula em Nova York em 23 de setembro.
À margem da Assembleia Geral da ONU, Trump apresentou a estrutura aos líderes árabes.
Embora não tenha sido considerada perfeita, a proposta foi amplamente endossada por um grupo-chave de países, incluindo Catar e Turquia, na esperança de que pudesse pôr fim ao conflito de quase dois anos o mais rápido possível.
“Tivemos uma sessão muito produtiva”, disse Witkoff um dia depois. “Apresentamos o que chamamos de plano de 21 pontos de Trump para a paz no Oriente Médio e em Gaza. Acredito que ele aborda as preocupações israelenses e, também, as preocupações de todos os vizinhos da região.”
Ele previu então que, nos próximos dias, o governo estaria pronto para “anunciar algum tipo de avanço”.
Adesão de Netanyahu
Antes que esse avanço pudesse ocorrer, no entanto, Netanyahu teria que aderir ao plano.
O presidente Donald Trump afirmou aos líderes árabes na cúpula de Nova York que estava confiante de que conseguiria que o líder israelense aprovasse — e de fato implementasse o plano.
Mas o trabalho para fazer isso estava apenas começando.
Nos dias seguintes, e ao longo do fim de semana, Witkoff e Kushner mantiveram horas de reuniões com o premiê israelense e sua equipe para analisar o plano palavra por palavra.
O ceticismo do primeiro-ministro em relação à proposta ficou evidente desde o início.
Ele questionou as disposições sobre a retirada israelense, se opôs às referências à criação de um Estado palestino e se opôs a qualquer cenário em que a Autoridade Palestina fosse responsável por governar Gaza, disse uma pessoa familiarizada com as negociações.
As discussões intensivas se estenderam, com Trump ligando ocasionalmente para tentar amenizar as diferenças.
Ele, Witkoff e Kushner — todos os três com raízes no mundo das transações imobiliárias — tentaram abordar as discussões com princípios comerciais em mente: encontrar o que cada lado busca e manobrar para que isso aconteça.
Várias mudanças foram feitas a pedido dos israelenses, segundo duas fontes, e uma delas as descreveu como relacionadas à retirada militar israelense de Gaza e ao desarmamento do Hamas.
Quando Benjamin Netanyahu chegou à Casa Branca em 29 de setembro, os assessores do presidente dos EUA estavam confiantes o suficiente para anunciar que teriam algo a declarar, a ponto de agendarem uma aparição conjunta dos líderes no Salão de Jantar de Estado.

Mas, nas horas que antecederam o evento, os dois homens estavam na Ala Oeste, continuando a discutir detalhes do outro lado da mesa na Sala do Gabinete, analisando cópias impressas do plano ponto por ponto.
E, após insistência de Trump — que via isso como um passo necessário para finalizar um acordo — o premiê israelense concordou em se desculpar com o líder do Catar pelos ataques aéreos do mês anterior. Ele fez a ligação do Salão Oval enquanto Trump equilibrava o telefone na coxa direita.
Espera da resolução
Apesar das condições, os líderes árabes deram seu apoio público ao plano e, segundo uma fonte, também um entendimento privado de que essas mudanças limitariam Netanyahu a aceitar a proposta.
Os dias seguintes foram de espera.
Donald Trump estava ansioso para saber como o Hamas estava respondendo.
Em uma ligação com o emir do Catar, dois dias após o anúncio do plano, o presidente dos EUA perguntou sobre o progresso, mas foi informado de que poderia levar algum tempo para o grupo responder, afirmou uma pessoa familiarizada com a ligação.
Problemas de comunicação com os líderes militares do Hamas em Gaza contribuíram para a demora para receber uma resposta.
O mesmo ocorreu com as divisões entre a liderança do grupo sobre elementos do plano, segundo autoridades americanas, que foram informadas das dificuldades por parceiros regionais.
Ainda assim, Trump estava ficando impaciente.
Na manhã de sexta-feira (3), ele emitiu um ultimato com prazo final para noite de domingo (5), esperando que isso estimulasse o Hamas a responder.
Mas a resposta levaria apenas mais algumas horas: o grupo palestino havia concordado em libertar todos os reféns restantes, embora não abordasse outros elementos-chave da proposta de Trump.
“Este é um grande dia”, falou o presidente em um vídeo otimista gravado no Salão Oval. “Vamos ver como tudo vai acabar. Precisamos concretizar a palavra final.”
Netanyahu estava bem menos entusiasmado, interpretando a resposta do Hamas como uma rejeição a parte do plano do líder americano.
Ele ficou surpreso com a rápida aceitação do plano por Donald Trump e duplamente surpreso quando o presidente ordenou que Israel parasse de bombardear Gaza enquanto os detalhes da libertação dos reféns eram definidos.

Em um telefonema, o republicano lamentou a perspectiva negativa de Netanyahu, disse uma pessoa familiarizada com a ligação. (Trump negou posteriormente, dizendo que Netanyahu “foi muito positivo”.)
Na opinião dele, a resposta foi um sinal de que o Hamas estava pronto para a paz, e ele optou por se concentrar no que o grupo palestino concordou em vez do que não concordou.
A Casa Branca publicou com entusiasmo a resposta completa do grupo em suas contas oficiais nas redes sociais.
Para o presidente dos Estados Unidos, a declaração do Hamas de que estava pronto para libertar todos os reféns restantes desde os ataques terroristas de 7 de outubro de 2023 foi suficiente.
Após meses de progresso frustrantemente lento, Trump parecia pronto para prosseguir como se a paz estivesse finalmente próxima — mesmo que os detalhes mais sutis permanecessem incertos.
Fonte: CNN BRASIL